sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Meu sapatinho.

Eu queria tanto um dia perder meu All Star de lona preta e cadarço
vermelho, tamanho 39. É aquele tipo de sapato que já anda sozinho, já
conhece meus trajetos e todos meus caminhos impossíveis. Funciona
como piloto automático. Tem as assinaturas no plástico branco que me
fazem lembrar uma porrada de histórias de fins desastrosos.

Meu All Star já me acompanha há um tempo considerável, e
provavelmente tem mais história pra contar do que todas as minhas
melhores amigas juntas. Levo ele nas viagens, pras praias, no
trabalho, nas aulas e nas baladas. E nada de eu conseguir perdê-lo.
Já coloquei na mala que foi despachada no avião, no bus pinga-pinga,
deixei jogado por aí em uma ou outra festa. Mas nada de perceberem
que meu tenizinho estava dando sopa por aí.

Depois de perceber que eu não seria capaz de perdê-lo com facilidade,
ainda que quisesse, comecei a criar melhor a minha estratégia para
escolher o lugar certo para deixar sem correr o risco de que o meu
sapatinho pudesse ser encontrado pela pessoa errada. Nenhum lugar tem
me parecido suficientemente encantador para merecer a quantidade de
histórias que guardo naquele pouco de lona e borracha.

Perder um sapato velho é uma forma de criar a suprema necessidade de
comprar um novo. E um sapato novo é o começo de uma vida nova. Assim
que eu tiver meu sapato novo terei que reaprender a andar. Porque o
sapato velho já conhecia todos os meus passos e meus lugares
preferidos.

Conseguir perder meu sapatinho seria como dizer pro mundo que ainda
quero que alguém o ache.

*Crônica feita para a oficina de Crônicas com o Carpinejar na feira
do livro 2006.
Exigência: O tema era pra ser "algo que você queira perder e não
consegue".

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